4.12.2016

Você

Nessa noite,
nesse sonho,
eu casei com você.

Acordei e um pranto convulsivo
abraçou meus olhos, nariz, boca e pulmão
fazendo estremecer
como muito antes antes
não fazia.
E o conforto
dos meus travesseiros se tornou vazio.

Você disse sim para nosso casamento,
Teve beijo na chuva no jardim,
Você comentava feliz
o novo armário para nossa casa...
Mas o anel encomendado não caía bem.
Nem em mim, nem em você.
Trabalhei no sonho, em formá-lo
aos nossos dedos e foi.
Faz vinte minutos que estou acordada
e ainda sinto o metal
no anelar esquerdo.
Enquanto escrevo
olho para minha mão,
o anel ainda está aqui?
O sinto, mas não o vejo.

Isso não foi previsão,
não foi desejo,
foi pesadelo.
Só para me lembrar que isso nunca irá acontecer.
O meu amor,
posso "nosso" implica algo mais,
nunca se realizou.
Eu te amei e
você nunca me amou...

Por cinco minutos eu casei com você,
e você dizia feliz que sim,
beijou-me de leve a boca
como na certeza de inúmeros beijos posteriores...
Abraçou-me a cintura por trás
como a prometer-me uma farta
e interessante e prometida e esperada
lua-de-mel mais a noite...

Mas a Poetisa não tem ninguém.
Vaga sozinha pela rua das palavras...
O que conta para mim é o verbo...
E o choro convulsivo vem...
Eu errei.
Em outra vida, eu muito errei.
E o preço a pagar por isso, hoje,
é a solidão,
é não ser par.

Hoje, me perguntaram porque os artistas eram assim...
Culpa, carma...
Somos esquizofrênicos, maníacos e loucos
que sentem o mundo
numa intensidade acima da escala da psiquê...

Hoje eu chorei outra vez...
Uma ferida amorosa,
por mais quieta que fique,
nunca se cura de verdade...
Há sempre pranto renovado,
sempre sangue novo a jorrar,
sempre choro reciclado a cair...
Ah! Como eu queria não ter coração
nessa hora da madrugada!
Como eu queria ter um abraço
para esticar meu corpo e pedir "pão"...

E eu vou seguindo a vida.
Me recuperando do caminho
com os pés limpos,
mas o coração...
Esse, meu amigo,
não está morrendo,
mas não está bem não...